sexta-feira, 7 de dezembro de 2018

Sabes a minha morada, sabes onde fica a minha caixa de correio, aquela onde deixaste as chaves, daquela vez lembras-te? Aquela vez em que tudo (re)começou, quando, já não te servindo para mais nada, escolheste não querer ver-me. Preferiste a caixa do correio.
Sabes o meu contacto, aquele que disseste já ter guardado num sítio seguro, p'ra quando mudasses de número não me perderes, lembras-te? Aquele número, gravado com aquele nome que escolheste ignorar quando apareceu no teu visor “tenho saudades tuas.”
E queria eu poder marcar o teu número no meu telemóvel, voltar a dizer, tantas vezes quantas fossem preciso para ganhar o teu coração, as saudades que tenho de ti, da tua voz, dos teus abraços onde o tempo parava, onde o teu perfume e os teus beijos me inebriavam mais que qualquer licor. 
Queria contar te sobre o meu dia, rir das nossas vitórias contra o mundo que lutava contra nós - sim, na verdade era uma luta, mas eu batalhava sozinha por algo que nunca existiu.
Mas sabes, sem que o quisesses ensinaste-me a não confiar em ti, a não contar contigo. 
Ensinaste-me da pior forma que apenas poderia contar comigo neste estranho amor que eu acreditava existir. 
Com todas as vezes que me deixaste desamparada, ensinaste-me o caminho para te largar. 
Em todas as tuas ausências que chorei, mostraste-me que só as minhas mãos poderiam limpar as minhas lágrimas. 
Deste-me todas as armas para lutar contra a minha vontade de ficar à tua espera e só assim consegui perder-me de ti. 
Quase morri de saudades... quase! 
Mas o teu desprezo trouxe-me de volta à Vida.

sábado, 15 de setembro de 2018

Vítima de amor

Nunca me prometeste nada 
Mas é a um qualquer fio de esperanças 
Inventadas por mim num de tantos devaneios
Que continuo a segurar me 

Nunca me deste nada 
Mas é de alegres memórias falsas 
Guardadas nos recantos dos meus anseios 
Que o meu cérebro insiste em lembrar-me

Em cada olhar de ódio, 
Em cada discussão e em cada grito, 
Em cada puxão de cabelos,
Em cada murro e em cada pontapé, 
Ela quis ver Amor.

Quantas mais mentiras lhe vais dizer 
Quantos mais versos ela vais escrever 
Quantas mais lágrimas vai derramar 
Quantos mais abusos vai o coração dela aguentar 
Até desistir de bater, 

E parar ?



Dedicado a todas as mulheres que sofrem em silêncio. 

terça-feira, 28 de agosto de 2018


Para quem sonha com Amor verdadeiro é difícil aceitar os pesadelos da realidade. Para quem procura Amor verdadeiro, é difícil manter a fé ao fim de tantas derrotas. 
É confuso ver como pode uma simples palavra de quatro letras ser tão complexa. Para uns chega cedo, cheio de felicidade, de filhos e de momentos felizes. Para outros chega cedo e acaba ainda sem ter desabrochado, murcho entre desentendimentos e traições. Há quem o descubra tarde e viva o resto dos dias preenchidos de alegria, há quem descubra tarde demais. Há quem nunca descubra.
O Amor parece sempre louco, imaturo, inconstante. Parece ser sereno, cheio de paz e pureza. O Amor tem lágrimas, tem desaforos, Amor precisa de comunicação, de cedências. 
Amor precisa de Amor. Todos precisamos de Amor e o Amor precisa de todos para viver.

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

#projectomeianoite - conto 5

Meia-noite. Acordou numa sala de paredes altas, numa cor que em tempos foi um branco fluorescente. O ar que sentia entrar-lhe nas narinas era gélido, o clima era de morte. As luzes que provinham de umas lâmpadas amarelecidas pelo tempo tremiam, conferindo àquela divisão taciturna um aspeto ainda mais assustador. As paredes estavam totalmente nuas. A única mobília daquela sala eram duas cadeiras e a mesa. “Quero sair daqui!”
Ao longe ouvia o mar bater teimosamente nas rochas e o vento não parava de assobiar. Em silêncio, imaginava-se sentada na plateia de areia molhada, apenas a admirar aquele espetáculo de ondas.
O sol já se tinha escondido atrás das colinas há tantas horas quantas as vezes o seu pensamento tinha divagado algures entre aquela sala gelada e os grãos de areia daquela praia que estava naquele dia mais salgada.
- “Maldita camisa, não me consigo mexer!” - Por muito que lutasse, ela vencia sempre. - “Merda de trapo estúpido!”
O mar continuava a bater furiosamente nas rochas, como se estivesse a medir forças com o vento que não perdia fôlego a assobiar entre as falésias.
De olhos fechados, imaginava o sabor do sal a beijar-lhe os lábios gretados. Desejava tanto estar naquela praia que quase sentia a água salpicar-lhe os dedos dos pés.
As veias começavam a latejar-lhe na testa e as pontadas na cabeça não tardava iriam voltar.
Era meia-noite e diariamente aquele desejo colocava-a em transe enquanto se enroscava preguiçosamente entre os cobertores.
Estava tão habituada a ostentar a máscara de sorrisos que só aqui, apenas na companhia dos seus pensamentos permitia que ela caísse e os rios de lágrimas corressem livremente pelas suas faces ressequidas.
Estava tão habituada a ostentar felicidade que se esquecia que guardava no peito um coração desfeito. Queria gritar por ajuda, qual náufrago delirante no meio do mar, mas poupava o seu fôlego para sustentar a mentira mais socialmente correta: “está tudo bem”.
Acabava sempre por disfarçar os seus sentimentos, na esperança que não fossem reconhecidos, num pânico constante de serem vislumbrados num olhar mais despido, com o pavor de nesse instante todas as suas fortalezas, que até então tão ferozmente tinha defendido caíssem por terra e que também ela caísse num abismo sem fim, sem um abraço para a poder amparar e salvar do mergulho galopante nessa escuridão. 

domingo, 28 de janeiro de 2018

#projectomeianoite - conto 4

Meia-noite. Escrevo pausada e apaixonadamente. Transformo em letras o ritmo do meu coração e teletransporto a minha mente sem que o meu corpo saia da frente do computador que recebe o bater mecanizado dos meus dedos nas teclas já desgastadas.
Numa viagem rápida, ultrapasso a cápsula do tempo e do espaço e aterro numa casa que cheira a mar.
«Devo ter deixado a janela aberta com a pressa.» Dispo aquela farda que me sufocou o dia inteiro, impregnada de sal. Corro pelas divisões em busca dele e encontro-o, poucos instantes depois, apenas de toalha à cinta. Presenteia-me com o seu mais belo sorriso, os seus braços fortes puxam-me na sua direção e beija-me apaixonada e calorosamente, como se fosse a primeira vez.
O banho estava preparado: água quente, espuma e pétalas de rosas. Há champanhe. Respiro o meu conto de fadas até à última lufada, como se este pudesse acabar antes de sequer ter começado.
Os números vermelhos e brilhantes do rádio-relógio marcam meia-noite. Já deitados vejo o peito dele subir e descer, num ritmo calmo. O corpo cansado repousa descoberto, tentando compensar a temperatura elevada do ar que enche a divisão. Os raios do luar atravessam a janela entreaberta, permitindo-me admirar os contornos que definem tão doce existência.

domingo, 21 de janeiro de 2018

Mãe.

Hoje fui visitar a minha mãe. À campa. Quase um ano passado e dói demasiado ver o seu rosto sorridente naquela moldura de lápide. Não combina, não faz sentido. Não consigo ir lá tantas vezes quanto deveria, quantas vezes seria política e socialmente correto, mas eu não vivo de aparência, vivo de memórias. Ainda estou a lutar para conseguir sorrir e conseguir segurar as lágrimas cada vez que penso nela.
Cada um deveria poder viver o luto como melhor suporta sem ter os dedos reprovadores alheios, a julgarem o número de visitas a um cemitério. Não são essas visitas que traduzem as saudades que eu tenho dela. Não são as vezes que estou lá, em frente ao granito adornado de flores que mostram a falta que faz na minha vida, nas nossas vidas. Não passou um dia desde que ela foi que não esteja no meu pensamento, nos meus sonhos, em tudo. Há tanto que acontece que me pergunto o que teria para dizer, quantos sorrisos teria para me dar, quanto abraços para me apertar, quantos “força filha, pensa positivo” para me dizer. Apenas imagino na minha cabeça e lembro-me do medo que tenho de esquecer o som da voz dela, a doçura do olhar, o calor dos beijinhos com que me enchia cada vez que me via. Tenho medo que o tempo seja cruel e apague tudo.

Quase um ano se passou e cada vez faz menos sentido.

sábado, 20 de janeiro de 2018

Amar, lutar e outros devaneios de fim-de-semana

Estes dias estava no sofá e enquanto os meus olhos se distraiam com a televisão o meu pensamento divagava, completamente alheio ao que se passava no exterior e dei por mim a fazer uma comparação tonta entre o amor e a matemática. Passo a explicar: a primeira coisa que aprendemos na matemática é que 1+1=2. E a primeira coisa que nos ensinam sobre o amor? É que o amor acontece quando um rapaz e uma rapariga gostam um do outro e ficam juntos. Ok, parece simples. Depois a coisa começa a complicar, entram as multiplicações, as subtracções, as divisões - e entram os ciúmes, o "já não gosto de ti, gosto de outra pessoa" ou o pior e catastrófico "só gosto de ti como amigo" que é o equivalente matemático a "qualquer número multiplicado por zero, dá zero".
Parece estranha esta comparação mas na verdade não é de todo totalmente descabida. A matemática é complicada, o amor também. Há quem domine a matemática e quem encontre um amor para a vida toda ainda na primavera da vida. Há quem precise de explicações para passar e quem procure os conselhos dos amigos para o primeiro encontro. E quando achamos que já estamos a dominar a ciência da coisa, bam!, entram as equações de segundo grau ao barulho, com mais uma incógnita para descobrir: estava tudo tão bem, ficavam tão bem juntos, porquê que acabaram?
Tal como na matemática, com os seus problemas sem solução, o amor tem razões que ninguém entende. Faz sentido?

segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

#projectomeianoite - conto 3

Meia-noite em ponto. 
Abriu os olhos, assustada. Estava tudo escuro. Inclusive o DVD estava desligado. «Não devia ter bebido o segundo copo de vinho’» pensou. Chamou por alguém. Mas que se passava com a sua voz? Não a ouvia!
Levantou-se do sofá, a medo. Tornou a chamar, em mais uma tentativa falhada. Percorreu os longos corredores da casa a procura de alguém. Mas que corredores, se a casa não os tem?
«Onde estou?» Dirigiu-se instintivamente ao WC. Despiu a roupa e preparou-se para um duche antes de se deitar. Finalmente ouve-se um grito naquele silêncio mortífero. Era dela. Corria sangue das torneiras. Fugiu envolta na toalha à procura de alguém. Encontrou um mordomo e tocou-lhe. Ou não. Não tinha a certeza, pois a sua mão atravessou-o, como se de um fantasma se tratasse. As relações com o mundo que a rodeava tinham diminuído drasticamente, ao mesmo tempo que tinham aumentado as conversas consigo própria. A loucura tinha-lhe tomado o cérebro de tal forma que quando o viu achou ser fruto dos seus delírios quase diários. Volta-se em busca de um pingo de realidade naquela alucinação. Perde os sentidos. Vê caras sem rostos a agarrarem-na e a prenderem-na. Mais uma vez tenta pronunciar qualquer palavra. 
Nada sai da sua boca.

segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

#projectomeianoite

Sabem aquela idade em que toda a gente acha que tem muito para ensinar ao mundo?
Que tem algo extremamente importante a dizer?
Em que acha que pode ser tudo - escritor, modelo, pintor, activista, and so on...?
Pronto, eu achava que podia ser uma escritora de sucesso e tive uma ideia fantástica: escrever um livro de contos (incompletos?) em que a única coisa que tinham em comum era apenas o horário em que se desenrolava a história - à meia noite (está explicado o título do post). Escusado será dizer que foi um projecto que ficou na gaveta e que agora voltou a ver a luz do dia (ou a luz do meus olhos?) enquanto andava eu a fazer as minhas arrumações mentais depois do desafio que me foi proposto - que é como quem diz «só quero descobrir onde tinha eu imaginação para escrever tanta m....».
Portanto, se quiserem acompanhar mais devaneios de quem não tem mais em que pensar (ou não quer...) é so seguir o hashtag #projectomeianoite.

P.S.: Eu não matei ninguém. Só para ficarem já os pontos nos i's.
P.S.2: Quero reforçar a parte de "projecto de gaveta"...ou seja, rascunho! Digamos que isto é work in progress, sem data limite de conclusão...ok?


Jane.

#projectomeianoite - conto 2

Meia-noite em ponto. Ela olha fixamente para o computador à sua frente. A luz que emitia iluminava toda a divisão ainda vazia.
Meia-noite em ponto. Ela prepara-se para escrever, de novo. Precisava desta rotina mais do que nunca. Precisava desta rotina como um drogado precisa de uma dose. Tecla após tecla, ela transforma em palavras os seus sonhos e as suas angústias.
Esvazia a mente, recicla pensamentos e reutiliza as memórias. Tecla após tecla, entra lentamente num outro mundo, num mundo só dela. Entra num mundo virtual, fruto da sua característica imaginação fértil.
Nessa noite estava presa num labirinto. Procurava ansiosamente por palavras, quaisquer umas. Mas palavras. Talvez perdidas num recanto qualquer do sótão da sua mente…

“Um dia acordei e não me conseguia expressar, feito difícil de igualar! Mas passo a explicar:
Tive um sonho complicado, pensava eu, de raciocínio ensonado, em que todas as palavras saiam mecanizadas, correctamente alinhadas, como uma fila de montagem, sem falhas, sem redundâncias. Sem 'mas' nem 'porquês' possíveis de saber. Directas, frias, inumanas por assim dizer.
Tudo o que me saía da boca transportava uma realidade nua e crua, sem dó nem piedade, e trespassava quem se metesse à frente, fosse ou não o destinatário mal fadado de tal literária crueldade.
E em bem fechava a boca, e bem as queria engolir, mas elas voltavam a subir, maiores, em força, com sede de vingança, e eu, perante tanta ânsia, lá as deixava sair.
Pobres letras, escravizadas por tanta crueldade, aterrorizadas de verdade!
E eu, quando acordei, sem me conseguir expressar, abri a boca num ensonado bocejo, e oh! , o que vejo, um vomitado de letras apavoradas!
Todas encolhidas, bem sofridas, cheias de sangue e de medo, aspecto pavoroso, perdidas num frenesim. Foram arrancadas do meu ser a ferro e fogo!

E para meu espanto, que feito horroroso, já nada restava de palavras em mim!”