domingo, 12 de abril de 2020

A minha Páscoa

A minha Páscoa começava cedo.
Ao contrario de todos os restantes domingos em que ficava a dormir até tarde, que mal acordasse voava para a cama dos meus pais, o Domingo de Páscoa começava cedo, quando os primeiros foguetes começavam a rebentar no céu azul.
Era possivelmente o Domingo mais atarefado do ano e ainda assim eu era sempre a última convidada a chegar àquela festa que já tinha começado tão cedo.
Quando me estava a sentar à mesa para tomar o pequeno-almoço - «Come bem que já sabes que vamos almoçar tarde e depois dá-te a fome!» ouvia a minha mãe avisar, com voz firme mostrando que eu não tinha outra alternativa (logo eu que nunca fui fã de pequenos-almoços adiantados) - já tinha o meu pai chegado com regueifa fresca, já a minha mãe estava a cozer os ovos com casca de cebola e já o assado estava na assadeira, pronta a ligar.
«Anda, tens que te ir vestir, não tarda está aí o compasso e tu de pijama!»
Já tinha a roupa pronta de véspera, roupa a estrear, passada e perfumada porque a Páscoa era sempre altura de ter roupa nova.
Já a minha mãe e o meu pai tinham varrido os passeios e preparado um tapete de folhas e pétalas de flores coloridas, a demarcar o caminho que haveria em breve de ser feito pelo compasso.
«Despacha-te, já se está a ouvir a campainha, o Compasso está mesmo a chegar»
A porta da sala, que raramente era utilizada - apenas para dar entrada ao Sr. da luz quando vinha recolher a contagem - estava nesse dia aberta, bem como as restantes janelas e portas. A luz invadia todos os recantos da nossa pequena e acolhedora casa, inundando o nosso lar com um brilho especial.
«Shhh, já estão aí a entrar, vem para aqui para a beira do Pai, anda.»
A minha mãe dava todas as ordens e controlava todas as etapas, sob o olhar atento do meu Pai.
O compasso entrava, naquele dia os rostos familiares dos nossos vizinhos ganhavam outra altivez e eu sentia-me intimidada pela seriedade do momento. O meu Pai entregava um envelope como mandava a tradição, e em troca recebíamos o crucifixo para beijar e um postal com a oração daquele ano.
Tudo se passava tão rápido e ainda assim quando recordo esses momentos vejo todos os detalhes como se estivessem a passar em câmara lenta.
Com o passar dos anos a Páscoa foi tomando outros contornos, outros lugares até ficar reduzida a mais uma data sem ouvirmos as ordens da minha Mãe.
Este ano, sem ordens, sem festejos, sem abraços.
Há um assado no forno que não posso partilhar com o meu Pai, há ovos da Páscoa que não foram feitos pela minha Mãe e há saudades.
Este ano, sem abraços e sem conversas de deitar fora como este dia exige.
Este ano, a Páscoa pede o derradeiro ato de amor que nos é exigido: isolamento social, resguardo, protecção.
Que este ano sirva para nos lembrar, em todas as Páscoa vindouras e não só, que o importante é o Amor, é a Família, é ter por perto os nossos, com quem partilhar sorrisos, momentos e comida feitas com o coração, pois tudo o resto, é só mesmo isso, o resto.

quarta-feira, 4 de março de 2020

De mim para mim. De mim para ti. De mim para quem precisar de ouvir tudo isto e talvez mais.


Quando te sentires cinzenta como uma manhã de chuva e nevoeiro:
Aprendi, de novo, que nada é por acaso. Que cada vez que cais e bates no fundo é apenas o embate necessário para te reergueres e iniciares a tua subida com ainda mais força e velocidade. 
Aprendi, de novo, que as desilusões são as lições que precisas para avançar mais um pouco nessa demanda que é a Vida. Que tudo o que sentimos que está a enrijecer, que está a empedernir o nosso coração, na verdade está apenas a fortalecer este músculo tão precioso e tão frágil. 
Aprendi que o universo coloca no nosso caminho as pessoas certas, não necessariamente boas ou más, apenas as certas para te acompanharem naquele momento e te entregarem, ainda que inconscientemente, o seu contributo na tua vida. 
Aprendi que a fé pode ser inabalável desde que tenhas tomado consciência de que tu és a tua única limitação e que nada nem ninguém te pode demover da tua busca pelos teus verdadeiros sonhos. Esses sonhos que sempre moraram aí dentro, entre a Rua do Coração e a Avenida da Inspiração. 
Aprendi que há caminhos que podem assombrar-te, que podem ser tão íngremes que só se ultrapassam sendo escalados, mas que não precisas - nem deves! - fazê-lo sozinha. 
Que podes - e deves! - dar a mão alguém, e está tudo bem! Está tão bem como se optares por sentar-te e recuperar fôlego antes de avançares. 
Porque aprendi também que o tempo é relativo, é medido com o teu relógio especial chamado Instinto, cujo tic-tac insististe sempre em não ouvir, mas que nunca perdeu corda nem saltou nenhum ponteiro. Um relógio especial que funciona no seu próprio fuso horário, e que o teu caminho o vai respeitar se tu também o fizeres. Não significa que estás para trás ou para a frente, ou que estás errada, apenas que estás no teu próprio fuso, no teu próprio ritmo. 
Aprendi que não é fácil, mas nada que valha a pena é. Que faz parte do nosso ADN pensar nisso, e colocar todos as opiniões alheias possíveis numa bimby de julgamentos e auto-sabotagem, mas o segredo na verdade é simples: só tens que fazer o que o teu coração te diz. Só tu podes ser o teu próprio juiz e decidir se esse caminho que estás a fazer, se essa decisão que estás a tomar é a mais acertada ou não. 
Aprendi um mantra sagrado: os outros que se fodam.
Mas a lição mais valiosa que aprendi é que por mais brilhante possa ser um luar num céu limpo e estrelado, que por mais encantador e de tirar a respiração possa ser um pôr-de-sol em pleno fim de tarde num quente dia de verão, nada terá mais luz que o teu sorriso mais puro, nada será mais avassalador que a tua gargalhada de felicidade. Sorri, ama-te e sê feliz.