quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

Batota para dar vida ao tasco...

Quando se vasculha o baú encontram-se destes rascunhos, palavras rabiscadas, ideias incompletas, devaneios de quem vai na rua com um olhar distraído e meia volta tropeça em frases soltas sem sentido...


"Ao longe James Bay canta meia dúzia de palavras sobre o amor e sobre a saudade, enquanto o meu olhar recai sobre os barcos rabelos parados, apenas oscilando levemente ao sabor da ondulação. Uma brisa fresca levanta-se e como é bem vinda, amainando o ar quente e sufocante com cheiro a Verão. Passa o metro na ponte D.Luis I e a minha atenção, outrora nos barcos, desfoca-se perdendo-se no frenesim que se passa à minha volta. Uma mota de água, bicicletas a toda a velocidade, pessoas a passear e pessoas a acelerar. Um saxofone tenta sobrepôr a sua melodia à rotina caótica dos transeuntes."

Jane.

sábado, 11 de fevereiro de 2017

Devaneios

"Nunca amei ninguém". Assim começaram os pensamentos a divagar enquanto se deixava abraçar pela água quente. "Nada passou de amontoado de tentativas infrutíferas de calar o silêncio que gritava dentro de mim." O barulho da torneira a pingar distraiu-a dos pensamentos. Relembrava os lábios carnudos de David, o olhar azul gelado de Arthur. Relembrava todos os outros homens que amou em falso, todos os que a quiseram amar e ela não permitiu. "Debaixo de água tudo parece perfeito", pensou, enquanto olhava para o seu corpo nu, mergulhado, por entre os buracos da espuma.
Ping. Ping. Ping. Aquele pingar de fundo não parava, quase que acompanhando as batidas do coração. Junto ao ouvido o chuveiro, também mergulhado, continuava a brotar água, com um sibilar que estranhamente a fez lembrar água a ferver na chaleira.
"Mostra-me o teu sexo."
"Casa comigo."
"Por favor fica comigo, porquê que fizeste isto?"
Os pensamentos rebatiam no cérebro à velocidade da luz, a sua cabeça doía tanto que a cegava.
Foi arrancada novamente dos seus pensamentos por Nádia, a sua labradora tresloucada. Duas patadas e um ganido. Faz sempre o mesmo sempre que estava deitada, inerte, noutro sitio que não fosse a cama.
"Sim, estou viva e estou bem", respondeu, rabugenta.
Esticou-se de novo, fechou os olhos e desejou com força que houvesse um botão que desligasse o cérebro.
Abriu os olhos e estremeceu, as vizinhas de cima estavam a fazer uma festa, tais eram os gritinhos histéricos.
Fechou de novo os olhos. A água continuou a brotar do chuveiro, ainda mergulhado, junto ao seu corpo. A banheira continuou a encher. Ela não voltou a acordar com nenhum barulho, encontrou o botão.